A arara-azul-de-lear é uma ave exclusiva da Bahia e também uma das 7 maravilhas da natureza. Porém, toda essa exuberância e raridade não foram suficientes para proteger a graciosa ave, que já é classificada como em perigo de extinção pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN) e está ainda mais ameaçada, por conta de uma possível obra no Estado.
De acordo com um Parecer Técnico, a empresa de origem francesa, Voltalia Energia do Brasil, pretende colocar em operação um parque eólico na rota de voo das araras.
O local escolhido para construção do Complexo Eólico Canudos, com capacidade para 12 parques, se sobrepõe exatamente à área que é uns dos principais refúgios da arara-azul-de-lear, na Caatinga baiana. “Achamos arriscado o funcionamento de um Parque eólico na área de ocorrência das learis. A espécie voa aos pares e em bando, de modo que um único evento de colisão poderá incidir na morte de muitos indivíduos e comprometer a viabilidade populacional em pouco tempo, ou seja, extinguir a espécie”, afirma Glaucia Drummond, superintendente técnica da Fundação Biodiversitas.
Um outro fato relevante nesse processo de licenciamento do Parque Eólico Canudos é que o licenciamento, pelo seu porte, está sendo conduzido pela forma simplificada. Contudo, segundo uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) “Não será considerado de baixo impacto (…) os empreendimentos eólicos que estejam localizados, em áreas de ocorrência de espécies ameaçadas de extinção e áreas de endemismo restrito, conforme listas oficiais.”, justamente o que ocorre na região de Canudos com as araraz-azuis-de-lear.
Para Felipe Melo, do Laboratório de Ecologia Aplicada da Universidade Federal de Pernambuco, “as turbinas eólicas têm forte impacto nas aves e morcegos, além de gerarem conflitos socioambientais bem documentados. Instalar turbinas eólica próximo às áreas de uma espécie tão ameaçada como a arara-azul-de-lear é temerário. O setor eólico não pode continuar agindo como um fator de conflito ambiental, precisa já ouvir a ciência e abraçar sua missão de ajudar para a transição para um mundo mais sustentável.”
A ave de exuberante beleza foi redescoberta no bioma ao final dos anos 1980. A espécie simboliza muito bem a força e a resistência brasileira, ela é encontrada somente na região do Raso da Catarina, justamente nas proximidades do referido empreendimento.
A ave já esteve à beira da extinção, basicamente em função de sua captura e comércio ilegal e também pela perda de seu habitat e alimento. O Raso da Catarina é tido como um dos locais ou sítios-chave, tanto da Aliança Global para Extinção Zero (AZE) como da iniciativa análoga em nível nacional a Aliança Brasileira para Extinção Zero (BAZE), sendo considerado o último refúgio de A. lear. Além disso, a região é classificada como área prioritária de importância extremamente alta para conservação da biodiversidade da Caatinga, segundo estudos do Ministério do Meio Ambiente para o bioma.
Por conta da necessidade extrema de cuidar dessa ave e de seu habitat, a Fundação Biodiversitas mantém, há quase 30 anos na Estação Biológica de Canudos, um programa pioneiro de recuperação da população da arara-azul-de-lear. A criação do programa de conservação, dedicado exclusivamente à proteção da espécie, foi motivada pela urgência de se reverter o estado de conservação que, à época, sugeria uma extinção próxima.
A área protegida pela instituição abrange hoje 1.500 hectares, o que proporcionou o aumento da proteção dos dormitórios e sítios reprodutivos das araras. Todo o trabalho realizado pela Biodiversitas e parceiros como a Judith Hart, a American Bird Conservancy, a Fundação Lóro Parque, o Busch Gardens Conservation Fund, a Fundação Grupo O Boticário de Proteção à Natureza, a Seguros Unimed, e outros, aumentou em quase 40 vezes o número de indivíduos vivendo livremente na natureza, segundo o último censo anual realizado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres – Cemave, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio em parceria com a Biodiversitas. Esse dado mostra, três décadas depois, que ações efetivas de conservação de seu habitat são cruciais para o desenvolvimento e garantia de sobrevivência da espécie.