BRASIL

As mulheres e o acesso à educação no Brasil

Quando pensamos na escola, algumas imagens surgem em nossa cabeça: meninos e meninas juntos, conversando com os mesmos professores e professoras, pensando em entrar em uma universidade, planejando seu futuro, escolhendo uma profissão. Matérias iguais para todos. Há duzentos anos isso não era possível.

A sociedade sofreu muitas transformações com o passar do tempo. Mudanças que, também, alteraram a educação, principalmente a feminina. Para entender como as meninas começaram a frequentar as salas de aula no Brasil, precisamos conhecer fatos fundamentais da história de nosso país.

Você sabe quando surgiram as primeiras escolas em terras brasileiras?

As primeiras escolas, aqui, surgiram no Brasil Colônia, período iniciado em 1530 com chegada da primeira expedição portuguesa com fins de povoamento.

No início, elas foram construídas, em sua maioria, pelos padres jesuítas, mas somente os homens podiam frequentar.

Desde a antiguidade, foi construído um pensamento que naturalizava a subordinação das mulheres na sociedade.

Em Portugal, na Idade Moderna, não era diferente. De acordo com as leis lusitanas, as mulheres faziam parte dos imbecilitus sexus, ou sexo imbecil. Nessa categoria, também estavam classificados as crianças e os portadores de deficiência neurológica.

Mesmo no século XIX, Charles Darwin, cientista inglês que se tornou célebre por sua teoria da evolução das espécies, acreditava que as mulheres eram intelectualmente inferiores.

A primeira reivindicação pela instrução feminina no Brasil partiu de um indígena, que pediu ao padre Manuel da Nóbrega que ensinasse sua mulher a ler e escrever.

Naquela Missão Jesuítica, entre os nativos, não havia segregação por gênero.

Então, o padre escreveu uma carta à rainha de Portugal, Dona Catarina, que negou o pedido.

Mas há registros de que uma mulher conseguiu burlar a regra. A indígena Catarina Paraguaçu, também conhecida como Madalena Caramuru, foi a primeira mulher que aprendeu a ler e a escrever, em território brasileiro.

Filha do português Diogo Álvares Correia, o Caramuru, com a índia Moema Paraguaçu, Madalena deixou uma carta de 26 de março de 1561 endereçada ao padre Manuel da Nóbrega. Em suas linhas, ela pedia que as crianças indígenas fossem tratadas com dignidade.

Madalena foi uma exceção dentro do sistema colonial português estabelecido no Brasil. A habilidade de escrita, entre as mulheres, era tão rara que até 1627, somente duas senhoras de São Paulo sabiam assinar o nome.

Por volta de 1678, surgiram os primeiros conventos no Brasil, também conhecidos como recolhimentos. Algumas freiras, porém, não demonstravam nenhum sinal de vocação. Eram, somente, levadas pelos pais, que por receio de dividir seus bens com os possíveis genros, as entregavam à Igreja. Também mulheres abandonadas por seus esposos eram acolhidas nas casas religiosas.

Os Conventos não possuíam uma estrutura formal de ensino. Porém, estando ali, as Irmãs e alunas tinham chance de estudar. Além de atividades como bordado e costura, aprendiam a ler, escrever, música, e o exercício da oração constante.

O método jesuíta predominou até 1759, quando os missionários foram expulsos da Colônia, em um evento conhecido como Reforma de Pombal. Assim o ensino passou a ser responsabilidade do Estado.

Nesse novo sistema, as mulheres foram autorizadas a frequentar as salas de aula, à época separadas por sexo.

Em 1808, um evento importante marcou os capítulos da nossa história: a família real portuguesa veio para o Brasil. Devido a transferência da corte para a Colônia, os homens passaram a se preocupar com o fato de suas mulheres aparecerem em público sem causar vergonha. Assim, grande parte das famílias começou a procurar professoras particulares, que podiam ensinar meninos e meninas em casa.

Vocês sabem quando surgiu a primeira Constituição do Brasil? Foi em 1824, durante o Período Imperial, e ela estabeleceu o ensino primário gratuito a todos os cidadãos, o que não incluia os negros escravizados.

Nas escolas do Império, as meninas aprendiam a ler e escrever, depois, as quatro operações matemáticas. Outra disciplina era conhecida como “artes do lar”, que tinha como objetivo formar boas senhoras do lar. Economia doméstica era outro conteúdo reservado às moças. Elas não aprendiam matérias relacionadas às ciências naturais, nem aquelas consideradas mais lógicas, como a geometria.

A partir de 1854 foram fundadas muitas escolas religiosas, como exemplo, o Colégio Imaculada Conceição, focado na educação das filhas de famílias ricas cariocas, seguindo os rígidos ensinamentos da Igreja Católica.

Mas uma mudança importante aconteceu num curto intervalo de tempo: o surgimento de escolas mistas que permitiam que meninos e meninas estudassem juntos, na mesma classe inclusive.

Foi também no século XIX que as mulheres puderam trabalhar como professoras.

Mesmo com oportunidades de trabalho desiguais, isso foi muito importante porque fez com que elas circulassem no espaço público. Grande avanço, ora, porque, no passado, as mulheres geralmente só tinham permissão de sair de casa para se dedicar às atividades religiosas, como ir às missas.

Na sociedade acreditava-se que as mulheres, como tinham o dom de educar seus filhos, também podiam educar outras crianças e adolescentes.

Entre as mulheres que frequentavam as escolas, podemos separar dois grupos: aquelas que estudavam para educar melhor os seus filhos e aquelas que tinham interesse na carreira profissional, para complementar a renda da família.

As Escolas Normais, que preparavam as meninas para serem professoras, tinham regras rígidas quando dirigidas por religiosos, como horário de visita para receber familiares e média alta para conseguir permissão para sair aos domingos.

Foi no final do século XIX que ser professora passou a ser visto como algo positivo e uma profissão respeitável. Mas havia segregação entre o trabalho dos homens e das mulheres.

No início, as mulheres poderiam somente trabalhar nas escolas mistas e do sexo feminino, enquanto os homens ensinavam nas escolas masculinas. Mais tarde, as professoras começaram a ensinar os primeiros anos da educação dos meninos.

A desigualdade não parava por aí: as mulheres não podiam ocupar cargos superiores, como o da direção. Seus salários eram mais baixos e tinham menos chances de subir na carreira. Para começar a ensinar, elas também deveriam ter, no mínimo 25 anos, a não ser que ensinassem na casa dos pais e se esses fossem merecedores de respeito.

Nesse período da História, a maioria das mulheres que procuravam os cursos de formação de professores eram órfãs e de classe média.

Hoje as aulas são interessantes e divertidas, todos os alunos, sem distinção, têm liberdade de interagir com os seus professores, tirar dúvidas e discordar de algum assunto. Nem sempre foi assim. É possível imaginar como eram os métodos de ensino?

No primeiro método de ensino, o professor que tinha vários alunos ensinava cada um individualmente. Esse modelo foi inspirado na educação doméstica, onde a mãe ensinava a cada filho e os mais velhos podiam ensinar aos mais novos. Mas sabemos que essa não foi a única maneira de ensinar, vamos conhecer outra!

Os alunos também podiam aprender através de um método focado na repetição oral e memorização, que fazia com que os alunos tivessem menos oportunidades de se expressar. Com essa forma foi possível ensinar muitos alunos de uma única vez, até porque os próprios estudantes eram usados como ajudantes dos professores em sala.

Mas esses modelos foram sendo substituídos por outros que incentivavam maior participação dos alunos, não mais apenas repetindo o que o professor dizia.

E como era a estrutura das escolas? Elas não tinham estrutura física adequada para oferecer conforto aos alunos, nem material suficiente como livros que auxiliassem os professores a dar aula de outra maneira.

Além das escolas que vimos até agora, surgiram também cursos profissionalizantes que preparavam as mulheres para o mercado de trabalho. No Rio de Janeiro, nasce a famosa Escola Profissional Paulo de Frontin. Lá, elas podiam escolher entre o Curso Comercial, que oferecia matérias escolares como contabilidade e línguas, e o Curso Profissional, com oficinas variadas de chapéus, flores e desenho.

E o ensino superior, como era? Sabemos que hoje em dia, homens e mulheres podem escolher livremente suas profissões e frequentar universidades, mas foi apenas em 1879 que as mulheres conseguiram permissão do governo para entrar nas faculdades. Mesmo assim, o desejo das mulheres em ocupar esses lugares não era o suficiente.

As mulheres solteiras deveriam apresentar a licença dos seus pais; já as casadas, autorização por escrito de seus maridos. Por isso, o número de mulheres que chegavam ao ensino superior era muito baixo. Além de todo preconceito da sociedade, elas não frequentavam cursos preparatórios, o que dificultava ainda mais a entrada das mulheres na faculdade.

A partir da década de 1950, o desenvolvimento industrial do Brasil fez com que houvesse um aumento na procura das  escolas de ensino médio com o objetivo de preparar as mulheres para o setor de serviços.

Ainda na década de 1950 e na de 1960, e de modo marcante até o final do século XX, o acesso à universidade e à diversificação dos campos de trabalho foi paulatinamente se ampliando. Houve uma virada das mulheres brasileiras.

De acordo com pesquisas recentes, as mulheres ocupam hoje mais da metade do número de inscritos nos cursos de graduação, superaram os anos de estudos quando comparadas aos homens, e representam 80% do número de professores da educação básica. Isso corresponde a mais de um milhão e meio dos profissionais desse setor.

Por portal Mulheres de Luta