BRASIL POLÍTICA

PSOL pode enfrentar debandada se embarcar em governo Lula

Em meio aos anúncios de participação de quadros do PSOL na equipe de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a expectativa de ter Sônia Guajajara como ministra dos Povos Originários, alas do partido querem impedi-lo de integrar oficialmente o novo governo.

Várias tendências internas, como o Movimento Esquerda Socialista (MES), do qual fazem parte nomes como Sâmia Bomfim, Mônica Seixas e Luciana Genro, tentam levar o partido para, senão uma oposição, ao menos uma posição de independência em relação ao PT.

O clima interno é de acirramento e tensão, segundo quadros ouvidos pelo GLOBO, e há risco de debandada a depender da decisão tomada pela direção nacional, que vai se reunir em dezembro para tratar o caso.

Em junho, um grupo de mais de 100 integrantes, entre eles Plinio de Arruda Sampaio Júnior, anunciou a desfiliação em massa após a legenda aderir à chapa Lula-Alckmin e formar uma federação com a Rede Sustentabilidade.

Agora, um grupo está insatisfeito com a composição mais à direita do gabinete de transição, com o ex-tucano Geraldo Alckmin (PSB), Persio Arida e André Lara Resende, por exemplo.

Mas o que mais pesa é a expectativa de que o governo Lula dependa de siglas como MDB, PSD e União Brasil para governar e garantir maioria no Congresso para aprovação de seus projetos.

Há também o caso do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro. Ainda que tenha anunciado oposição ao governo Lula, a sigla continua abrigando deputados fisiológicos. A estimativa na executiva do PL é que, entre os 99 deputados eleitos, mais de 40 estarão dispostos a ajudar o futuro governo, se forem atendidos com cargos e emendas. O PSOL é contra se aliar a esses parlamentares.

O presidente da sigla, Juliano Medeiros, e o deputado federal eleito Guilherme Boulos, próximos a Lula, foram anunciados na equipe de transição — o que incomoda a ala mais à esquerda do partido, ainda que a decisão tenha sido deliberada e vencido uma votação na direção nacional por 10 votos a 9.

Braga diz que as prioridades do PSOL são os enfrentamentos ao bolsonarismo e ao fisiologismo do Centrão. Para ele, esses objetivos não poderiam ser alcançados com a legenda integrando um governo que deve depender de acordos com esses grupos à direita.

— Quando você está debaixo do guarda-chuva do governo, você perde a independência para fazer esse enfrentamento. Para o PSOL manter suas pautas ativas, vai ter muito mais capacidade de fazer isso enfrentando a extrema-direita fora do governo do que ocupando cargos lá dentro — diz Braga.

O PSOL nasceu de uma dissidência do governo Lula. O partido foi fundado em 2004 após a expulsão dos parlamentares Heloísa Helena, João Fontes e Luciana Genro do PT. Uniu-se então a movimentos sociais e a intelectuais descontentes com a gestão petista e, a partir de então, fez oposição tanto a Lula (2003-10) quanto a Dilma Rousseff (2011-16).

Então candidata a presidente da República pelo PSOL em 2014, Genro chegou a comparar Dilma e o candidato tucano Aécio Neves como “irmãos siameses” durante a campanha.

O partido voltou a se aproximar dos petistas no impeachment da presidente, a que muitos quadros chamam de golpe, foi contra a prisão de Lula no âmbito da Operação Lava-Jato e entrou de cabeça na campanha pela eleição de Lula.

Seixas, deputada reeleita na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), argumenta que o PSOL não poderá mobilizar manifestações de rua para pressionar o governo Lula se a sigla fizer parte dele.

— Ambos os lados entendem que os próximos dias vão ser determinantes para a identidade do PSOL. Se a gente assume um novo perfil ou se vai ser consequente com a nossa história — diz Seixas.

A esperança do grupo contrário ao embarque é que duas tendências internas que votaram a favor de compor a equipe de transição são contra o partido ter cargos na máquina federal — número suficiente para virar o apertado placar que permitiu Medeiros e Boulos integrarem o gabinete transitório.

Procurado, Medeiros diz que o debate sobre o assunto não começou, e que o foco agora é a transição de governo.