RELIGIÃO

Opinião: A Crise de Identidade da Igreja

A veneração excessiva de figuras humanas dentro do contexto cristão tem se tornado um fenômeno preocupante, pois ultrapassa os limites da admiração saudável e assume contornos de idolatria sutil. Quando alguém passa a considerar seu líder espiritual como referência absoluta, perde a capacidade crítica e se torna incapaz de perceber seus erros, justificando-os com explicações atenuantes e até teológicas. Esse mecanismo psicológico cria uma mente condicionada que, por influência emocional, transforma pessoas em paradigmas de perfeição. Dessa forma, o indivíduo passa a seguir mais o líder do que os princípios bíblicos, e suas convicções se moldam não pelo texto sagrado, mas pela interpretação daquele a quem segue. Aqui nasce a distorção: quando a fé passa a ser guiada por opinião humana, e não pela revelação divina.

No ambiente religioso, especialmente no meio evangélico, essa tendência gera consequências devastadoras. Surge um terreno fértil para manipuladores, falsos mestres e exploradores da fé, que se aproveitam da fragilidade emocional e da ingenuidade espiritual de muitos. O povo, cada vez mais cativo à personalidade de seus líderes, desvaloriza o estudo bíblico e passa a confiar cegamente em discursos prontos. A autoridade da Palavra é substituída pela eloquência, pela influência social ou pelo carisma. Assim, aqueles que deveriam ser arautos da verdade tornam-se propagadores de opiniões, e o Evangelho é gradativamente trocado por conveniências, slogans e narrativas. Nesse ambiente, o relativismo floresce e passa a vestir trajes religiosos, como se fosse parte legítima da fé.

O apóstolo Paulo alertou sobre esse tempo: haveria um momento em que muitos amontoariam para si mestres conforme seus próprios desejos, rejeitando a sã doutrina, porque ela confronta a carne, incomoda, desnuda. A sã doutrina, entendida como aquilo que está claramente revelado nas Escrituras, já não é mais parâmetro para muitos. O que passa a determinar a verdade é a popularidade e a aceitação social. Práticas que outrora eram reconhecidamente contrárias à fé cristã tornam-se normais, não porque a Bíblia as respalde, mas porque aqueles que as defendem se tornaram ícones. A santidade, a obediência e a renúncia, pilares da fé cristã, são substituídas por permissividade, conveniência e entretenimento. A Igreja, então, adota uma linguagem espiritual, mas com fundamentos terrivelmente humanos.

Desse cenário, emergem três expressões da Igreja Cristã Evangélica na atualidade. A primeira, formada por aqueles que desejam conhecer a verdade bíblica para praticá-la, não apenas como teoria, mas como vida. Buscam viver uma fé que transforma, confronta e molda o caráter à imagem de Cristo. A segunda, composta por aqueles que estabelecem seus próprios conceitos e depois procuram na Bíblia textos isolados que os validem, construindo uma fé invertida, onde o homem molda a Palavra e não o contrário. Por fim, há a terceira, que vive indiferente, sem oposição nem convicção, transformando a experiência da Igreja em uma convivência social, quase um clube de amigos com linguagem religiosa.

Essa realidade revela uma crise profunda: uma crise de identidade. A Igreja parece não saber mais quem é, por que existe e o que representa no mundo. A identidade da fé está sendo corroída por opiniões, a identidade espiritual está sendo diluída pelo pragmatismo, e a identidade ética está sendo substituída por conveniência. O que deveria ser o Corpo de Cristo corre o risco de se tornar um corpo estranho, dividido, fragilizado e quase irreconhecível. Porém, permanece uma esperança: Deus sempre preserva um remanescente fiel, que resiste às pressões culturais, rejeita a idolatria humana e escolhe ser guiado pela verdade da Palavra. É nesse remanescente que está a possibilidade de restauração e de uma nova consciência espiritual para a Igreja de Cristo.

Teobaldo Pedro.
Juazeiro-BA.

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