BAHIA

Bahia: um terço da população não estuda, não trabalha e não faz faculdade

A Bahia tem o segundo pior índice de adultos com ensino superior completo no Brasil. Segundo dados divulgados nesta quarta-feira (19) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 1 em cada 10 adultos baianos (10,1%) concluiu o terceiro grau em 2018. Com esse percentual, a Bahia ficou acima apenas do Maranhão, onde só 8,6% dos adultos terminaram a faculdade. A taxa do estado ficou abaixo da média nacional, de 16,5% das pessoas de 25 anos ou mais de idade com curso superior completo em 2018.

No estado, o percentual de adultos com nível superior praticamente não mudou entre 2017 (9,9%) e 2018 (10,1%). Nesse período, o estado foi ultrapassado por Alagoas (de 8,4% em 2017 para 10,3% em 2018) e Pará (de 9,1% para 10,7%).

Aliado a isso, a Bahia tem outro dado preocupante, na avaliação de especialistas: o percentual de pessoas de 15 a 29 anos de idade que não estavam estudando e nem trabalhavam avançou pelo segundo ano consecutivo e chegou a 28,2% em 2018 – quase um milhão de pessoas nessa situação (962 mil).

Para além da educação, os resultados revelados pela Pesquisa Anual por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-Contínua) apontam para um futuro preocupante da juventude baiana. Hoje, um terço da população do estado não estuda, não trabalha e ainda tem acesso limitado ao ensino superior.

“Estamos diante de um cenário muito preocupante. O número da Bahia é muito baixo mesmo em relação ao do Brasil, cuja média já é muito baixa. Se olharmos países em desenvolvimento, a taxa de população com ensino superior é de 30% a 35%”, avalia Tarso Nogueira, pró-reitor de Graduação do Senai Cimatec. 

Ele cita os casos de Israel e Coreia do Sul, países que passaram por um ciclo curto de desenvolvimento e hoje se destacam em inovação tecnológica. “São países que têm mais de 50% da população com ensino superior. Isso é importante porque estamos vivendo grandes transformações tecnológicas e isso vai se acelerar muito nos próximos anos, a chamada sociedade 5.0, amplamente conectada. O Brasil precisa de uma massa populacional preparada para essas transformações”, ressalta.

Nogueira pontua ainda que a tecnologia está em franca expansão e não se relaciona apenas com as engenharias, mas entra em áreas como Direito, Medicina e Ciências Sociais. “Nos EUA, as Ciências Sociais já estão estudando a relação de humanos e robôs. Na Universidade de Illinois, cursos de Medicina estão sendo integrados com Engenharia”, conta.

Razões
O estudante de Jornalismo Cássio Moreira, 21 anos, enfrenta essa realidade. No quinto semestre em uma instituição privada de Salvador, ele precisou trancar o curso: “Tive que sair do estágio, que era uma fonte de renda, e meu pai sofreu um acidente, tive que cuidar dele. Fiquei apertado e tive que trancar”.

Cássio espera voltar ainda este ano, mas não esconde a preocupação. “Tem sido bastante difícil com esses cortes e contingenciamentos, o que prejudica o acesso às instituições públicas. As instituições particulares não oferecem alternativas nem condições para que os estudantes possam permanecer”, diz.

Embora, na Bahia, o número de pessoas que terminaram o ensino superior seja o segundo pior do país, a realidade do estado não difere muito do resto do Brasil. A coordenadora de projetos do Todos Pela Educação, Thaiane Pereira, diz que o percentual de pessoas jovens que não trabalham nem estudam preocupa. No Brasil, em 2018, eram 23% daqueles com idades entre 15 a 29 anos.

“Os gestores públicos precisam entender quem são esses jovens que estão fora da escola e do mercado. Tem uma massa enorme de jovens, com alto potencial, subaproveitados”, diz Thaiane.

Desigualdades

Thaiane afirma que este cenário é reflexo da realidade do país de desigualdades sociais. Na Bahia, a taxa de pessoas com ensino superior completo entre a população branca foi de 17,9%. Entre negros e pardos, o número cai pela metade (8,4% deste grupo).

Além disso, os maiores índices estão nas regiões Sul e Sudeste. A taxa de analfabetismo reflete as desigualdades regionais, com as taxas mais elevadas no Nordeste (13,9%) e Norte (8%). No Sudeste, era de 3,5%. Na Bahia, 12,7% das pessoas acima de 15 anos são analfabetas.

“Nível de desigualdade que ainda permanece muito alto e é fruto de um padrão histórico, que vem passando entre as gerações. Essas populações sofrem com maior vulnerabilidade social, com altas taxas de trabalho juvenil, e estão mais dispostas à violênica”, avalia Thaiane.

Início do problema

Outro ponto levantado por ela é quanto à realidade das escolas, o que pode ser observado pelas taxas de evasão. Aos 4 ou 5 anos, quando a educação passa a ser obrigatória, pouco mais de 9 em cada 10 crianças baianas estão na pré-escola: 96,8%. A taxa é a quarta do país e está acima da média nacional (92,4%).

Mas no grupo etário de 11 a 14 anos, a defasagem/abandono escolar já começa a se apresentar. Nessa faixa etária, duas em cada 10 crianças na Bahia (19,9%) já não estão cursando o segundo ciclo do ensino fundamental. Esse percentual mais que dobra entre os de 15 a 17 anos.

Nessa faixa etária, 44,6% ou já saíram da escola ou ainda não chegaram ao ensino médio. “Isso está relacionado a diversos fatores. Desde uma escola que não faz parte da realidade adequada, até outros fatores relacionados a trabalho, cuidar de alguém, principalmente as mulheres”, afirma.

Para os especialistas, o caminho passa por mais investimentos, com foco na educação básica e ampliação do acesso ao ensino superior.

Salvador melhora índice na pré-escola

De acordo com a Pnad Contínua, Salvador conquistou o terceiro lugar entre as capitais com a melhor taxa de escolarização da pré-escola (crianças de 4 e 5 anos). Na capital baiana, a taxa em 2018 foi de 98,5%, abaixo apenas de outras duas cidades nordestinas – Teresina, no Piauí, e São Luis, no Maranhão, com cerca de 99%.

Nas pré-escolas, a capital evoluiu em relação a 2016, quando a taxa era de 96%.

“Temos ações contínuas nas comunidades para  buscar as crianças que estão em idade escolar e não estão na escola”, diz o secretário municipal da Educação de Salvador, Bruno Barral. 

Ele avalia que a educação é baseada em três pilares: acesso, permanência e aprendizagem. Neste sentido, Barral ressalta o projeto Escola Sem Muros, que abre as portas das unidades de ensino para as comunidades. Ele reforça que a prefeitura tem investido para proporcionar uma boa ambiência na escola, com boa infraestrutura, incentivando a participação dos pais e com merenda de qualidade, por exemplo.

O secretário conta que, entre 2013 e 2016, o número de vagas na educação infantil saltou de 17 mil para 44 mil na capital e que 60% das escolas já foram reformadas e outras 19 estão com intervenções de reconstrução e ampliação em andamento.

A prefeitura tem feito avaliações no início e no final do ano letivo. “É uma forma de acompanharmos, sabermos como o aluno entra e como ele sai”, diz.

Frequência escolar ainda é problema

Em 2018, a taxa ajustada de frequência escolar líquida entre as pessoas de 15 a 17 anos, que mede quantas delas estão na escola e cursando o nível de ensino adequado à idade, refletindo repetência e evasão escolar, era de 55,4% na Bahia. Essa foi a segunda taxa mais baixa do país, acima apenas da verificada em Sergipe (50,8%).

A defasagem/abandono escolar na Bahia praticamente duplicava novamente na faixa etária seguinte. Em 2018, pouco mais de 8 em cada 10 jovens de 18 a 24 anos ou haviam abandonado a vida escolar ou ainda não tinham chegado à universidade. O estado tinha a menor taxa ajustada de frequência líquida do país para o grupo: 16%.

Além destes dados, a Bahia teve no ano passado indicadores negativos para a educação. O ensino médio do estado ficou em último lugar no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). De acordo com os dados, a Bahia ficou com nota 3 no ensino médio – 1,3 abaixo da meta para o ano, que era de 4,3.

Abandono, atraso e notas baixas em avaliações foram os motivos apontados pelo Ministério da Educação (MEC) para o índice alcançado pelo estado.

Cássio espera voltar ainda este ano, mas não esconde a preocupação. “Tem sido bastante difícil com esses cortes e contingenciamentos, o que prejudica o acesso às instituições públicas. As instituições particulares não oferecem alternativas nem condições para que os estudantes possam permanecer”, diz.

Cássio tem 21 anos e precisou trancar o curso de jornalismo por conta das dificuldades financeiras
(Foto: Marina Silva/CORREIO)
Fonte: Correio da Bahia

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