BRASIL

Defensoria pede ao STJ saída urgente de Sérgio Camargo da Fundação Palmares

O recurso foi apresentado nesta quarta-feira (3) ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e é endereçado ao presidente da Corte, João Otávio de Noronha. Em fevereiro deste ano, o ministro atendeu pedido do governo e liberou a nomeação de Camargo.

Na prática, a defensoria quer que, enquanto o STJ não julga o caso definitivamente, sejam restabelecidos os efeitos de uma decisão da Justiça Federal do Ceará que suspendeu a nomeação em novembro de 2019.

De acordo com o juiz federal Emanuel José Matias Guerra, o chefe da Fundação Palmares “ofende” a população negra, a quem deveria defender.

A Fundação Cultural Palmares foi criada em 1988 para promover e preservar os valores culturais, históricos, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira. A organização tem entre suas competências a emissão de certidão às comunidades quilombolas.

Hoje, a organização está vinculada à Secretaria da Cultura e, consequentemente, ao Ministério do Turismo.

Desrespeito ‘concreto e evidente’

Ao STJ, a defensoria argumenta que a gestão de Sérgio Camargo “desviou a Fundação Cultural Palmares de suas finalidades legais e dos imperativos que devem reger a administração pública”.

“O que antes a decisão da presidência do Superior Tribunal de Justiça que suspendeu a liminar caracterizou como um excesso ‘em manifestações em redes sociais’ tornou-se um concreto e evidente desrespeito ao ordenamento jurídico, apto a justificar a reconsideração da suspensão e o restabelecimento do determinado pela primeira instância federal”, afirma a DPU.

No pedido, a defensoria ressalta ser exigido de quem preside a fundação “integral adesão aos propósitos” atribuídos por lei à organização, “o que, de forma muito transparente, não acontece no presente caso”.

“Mais claro impossível: a existência da raça negra é a premissa normativaconstitucional para a criação da Fundação Cultural Palmares que resta flagrantemente violada pela publicação dos textos em sua página na internet durante a gestão do Sr. Sérgio Nascimento de Camargo. Nesses termos, o desvio de finalidade na sua nomeação ganha a realidade e faz urgente a reconsideração da decisão da presidência do Superior Tribunal”, cita DPU.

Histórico

A nomeação de Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Cultural Palmares foi oficializada em 27 de novembro de 2019 e gerou uma série de críticas e indignação.

Numa publicação antes de ser nomeado para o cargo, o jornalista classificou o racismo no Brasil como “nutella”. “Racismo real existe nos Estados Unidos. A negrada daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”, afirmou.

Declaração do novo presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Nascimento de Camargo, publicada em rede social — Foto: Reprodução
Declaração do novo presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Nascimento de Camargo, publicada em rede social — Foto: Reprodução

Ele também postou, em agosto de 2019, que “a escravidão foi terrível, mas benéfica para os descendentes”. “Negros do Brasil vivem melhor que os negros da África”, completava a publicação

Sobre o Dia da Consciência Negra, Sérgio Camargo afirmou que o “feriado precisa ser abolido nacionalmente por decreto presidencial“. Ele disse que a data “causa incalculáveis perdas à economia do país, em nome de um falso herói dos negros (Zumbi dos Palmares, que escravizava negros) e de uma agenda política que alimenta o revanchismo histórico e doutrina o negro no vitimismo”.

Sérgio publicou uma mensagem numa rede social na qual disse que “sente vergonha e asco da negrada militante”. “Às vezes, [sinto] pena. Se acham revolucionários, mas não passam de escravos da esquerda”, escreveu.

Em 13 de maio, aniversário da Lei Áurea, Sérgio Camargo publicou artigos depreciativos a Zumbi no site oficial da instituição. Em redes sociais, disse que Zumbi é “herói da esquerda racialista; não do povo brasileiro. Repudiamos Zumbi!”.

O Ministério Público Federal apresentou uma representação para que o presidente da fundação responda na Justiça por improbidade administrativa.

Neste mês, o jornal “O Estado de S. Paulo” trechos de uma reunião da qual Camargo participou. Na gravação feita sem o conhecimento dele, o presidente da fundação chamou o movimento negro de “escória maldita”.

Na ocasião, Camargo também disse que Zumbi era “filho da puta que escravizava pretos”, criticou o Dia da Consciência Negra, falou em demitir “esquerdista” e usou o termo “macumbeira” para se referir a uma mãe de santo.

De acordo com a publicação, o encontro, ocorrido em 30 de abril, teve participação de outros dois servidores da fundação e serviu para tratar do desaparecimento de um celular corporativo de Camargo.

Na mesma reunião, a mãe de santo Baiana de Oyá foi xingada de “filha da puta”, “macumbeira” e “miserável” por Sérgio Camargo. Ela é coordenadora de Políticas de Promoção e Proteção da Diversidade Religiosa da Secretaria de Justiça do Distrito Federal e denunciou Camargo por injúria racial, discriminação racial e discriminação religiosa.

Mãe Baiana de Oyá registra queixa contra Sérgio Camargo em delegacia no DF — Foto: Ògan Luiz Alves/Projeto Oníbodê
Mãe Baiana de Oyá registra queixa contra Sérgio Camargo em delegacia no DF — Foto: Ògan Luiz Alves/Projeto Oníbodê

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