Reportagem

Feminicídio: A cada duas horas uma mulher é morta no Brasil

Por mais que sejam realizadas campanhas de intensificação contra a prática do feminicídio (perseguição e morte intencional de pessoas do sexo feminino, definida como um crime no Brasil), em média a cada duas horas uma mulher é morta no país. Essas ocorrências se espalham por diversos estados e cidades. No último domingo, uma mulher sofreu tentativa de homicídio, em São José do Egito, localizado no Sertão de Pernambuco.

A vítima, que foi socorrida por uma testemunha, sofreu golpes de facadas, pelo próprio namorado. Ela acionou a GT da operação convivência para atender a ocorrência e foi conduzida para o Departamento de Policia da cidade para realizar o B.O (boletim de ocorrência). A equipe policial realizou uma busca para tentar encontrar o acusado, que fugiu do local, mas não houve sucesso.

 

Relato de caso de violência doméstica 

 

Em Juazeiro, no norte da Bahia, também há casos de mulheres que são agredidas por seus companheiros, seja essa agressão física ou psicológica. “Maria Aparecida, de 32 anos,” (nome fictício, porque a vítima não quis se identificar com o nome do registro de nascimento), moradora do bairro Itaberaba, conta que viveu em uma relação abusiva, entre idas e voltas, por 13 anos e que nunca teve paz durante o período que conviveu com o agressor.

“No começo ele era uma pessoa muito boa comigo, o problema era o ciúme. Depois do nosso primeiro filho a gente se separou. Me envolvi com outra pessoa, não deu certo. Voltei pra ele. Dei uma segunda chance, mas ele não gostava do meu filho porque não era filho dele e começavam  as brigas, as discussões. A gente se separa e ficava indo e voltando. Nessas idas e voltas tive mais dois filhos com ele e  na nossa última separação foi onde veio as agressões físicas”, diz Aparecida.

Maria relata que o ex-companheiro não aceitava a separação. Um dia ela foi para uma missa e quando chegou  em  sua casa, ele tinha queimado todas as suas roupas e a ameaçou de morte. Então, ela foi dormir na casa de uma tia. “passei à noite com meus filhos e ele dizendo que iria me matar, que daquela noite eu não passava. Quando o dia amanheceu, acordei com ele puxando meus cabelos e com uma faca nas minhas costas. Meu filho acordou e começou a gritar desesperado e ele saiu correndo. Passei duas semanas em estado de choque”.

Depois da agressão física, Aparecida prestou queixa na Delegacia da Mulher e ele foi intimado. Ela recebeu medidas protetivas, porque ele ainda continuou ameaçando-a de morte. “Ele se afastou, mas depois de um mês voltou a me ameaçar, dizer que ira me matar, que não aceitava a separação. Liguei para polícia, ele foi preso por dois dias, a família pagou um  advogado e ele saiu”.

Maria está separada do agressor há dois anos. Ela finaliza o relato com um resumo de como se sentia durante a convivência com o ex-companheiro e fala do trauma que ainda carrega por causa da relação abusiva que viveu. “Eu não tinha paz, não sabia o que era sossego com ele infernizando a minha vida. Mas até hoje vivo assustada, tenho medo que ele me mate. O meu filho, que não é filho dele, também tem medo. Todos sofremos, finaliza Maria”

 

 

Leis Maria da Penha/ Feminicídio

 

A Lei nº. 11.340/06, conhecida como “Lei Maria da Penha” assegura-se de um conjunto de elementos que tem como objetivo controlar e prevenir a violência doméstica e familiar cometida contra a mulher. De acordo com a lei, caracteriza violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

Segundo a lei, a violência pode ser praticada, na unidade doméstica, no convívio familiar, em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a vítima, independentemente de tempo de convivência. Além da violência física, definida como qualquer atitude que ofenda sua integridade ou saúde corporal.

Já a Lei 13.104/15 caracteriza o feminicídio como uma nova modalidade de homicídio qualificado, quando o assassinato de mulheres por razões da condição do sexo feminino, envolve violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Ainda De acordo com a lei a pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado durante o período gestacional ou nos três meses, após o parto. Também contra pessoas menores de 14 anos, maior de 60 anos ou com deficiência, na presença de descendente ou de ascendente da vítima.

Em Juazeiro, os casos de violência contra à mulher podem ser denunciados na Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher- DEAM, criada em 2006, no mesmo ano da implantação da Lei Maria da Penha, com objetivo de prevenir e combater a violência domestica, no município.

 

Advogada fala das características do relacionamento abusivo

 

O Brasil ocupa o 5º lugar no ranking de feminicídio, de acordo com a ONU Mulheres. Segundo a advogada, Kênia Lima, no Brasil três a cada cinco mulheres são vítimas de relacionamentos abusivos, na maioria dos casos, as violências silenciosas predominam. Esse tipo de violência não deixam marcas visíveis, mas aprisionam milhares de mulheres diariamente.

“Todos os dias temos notícia de alguém que vive ou que viveu abusos, esse tipo de relacionamento chega de uma forma sútil, inicialmente parece até uma forma de “cuidado” que prende a vítima até que se torne quase impossível se libertar”. O abusador vai afastando a vítima das pessoas do seu convívio habitual, amigos, parentes, e manipula de uma forma ardilosa fazendo com que a vítima se sinta culpada por tudo que acontece dentro do relacionamento”, esclarece a advogada.

“Se você vive um relacionamento que te aprisiona, que não permite que você seja quem você é, se, de alguma forma você tem sido silenciada, você pode estar sofrendo abusos e por mais difícil que pareça você precisa se libertar, e o primeiro passo é falar, procurar ajuda. Não se cale, não se sinta envergonhada, o problema não está na vítima” ressalta Kénia Lima.

 

Estatística, no Brasil, Bahia e Juazeiro-BA

 

Em uma matéria publicada, recentemente, pela revista veja, https://veja.abril.com.br/brasil/dormindo-com-o-inimigo-a-violencia-psicologica-contra-mulheres/ o Brasil registra mais de 240.000 denúncias de abuso desse tipo, realizadas por mulheres que decidiram não aceitar à prática de humilhações dos seus parceiros.

Na Bahia, segundo matéria publicada, pelo blog de Edenevaldo Alves, com base em dados obtidos pelo Ministério Público, as denúncias de feminicídio, em 2020, chegaram a cerca de 70. Já em Juazeiro (BA) foram registrados três casos.

 

Por Elinete Carvalho, jornalista