BAHIA

Avanço do agronegócio preocupa comunidade quilombola Curralinho, no oeste baiano

A comunidade quilombola de Curralinho, no município da Barra, Oeste da Bahia, distante 674 km de Salvador, passou a conviver com ameaças e invasões em seu território desde a chegada de grupos portugueses que implantaram empreendimentos de agronegócio no seu entorno.  Grandes fazendas de produção de grãos e criação de gado bovino foram implantadas próximas à comunidade, que é composta por 273 famílias. Desde então, o sossego da comunidade foi interrompido.

Moradores do quilombo afirmam que a chegada das empresas veio acompanhada do discurso de desenvolvimento e geração de emprego e renda para a comunidade e região. Entretanto, o que as famílias estão presenciando é a invasão do seu território e o risco de perderem seu espaço de reprodução da vida.

Os/as quilombolas relatam ainda que, no momento, uma fazenda está em expansão, construindo cercas e desmatando a vegetação nativa do território, usado tradicionalmente pela comunidade. A comunidade se diz muito apreensiva, pois atualmente existem dois tratores fazendo o desmatamento da caatinga, inclusive afetando lagoas naturais que são reservatórios de água onde os animais do quilombo bebem no período da seca.

De acordo com os/as moradores de Curralinho, a empresa alega ter adquirido a área por meio de compra feita a um terceiro e que possui documentos, porém a comunidade historicamente sempre usou o território de forma comunitária para criação de animais no modo extensivo na pastagem natural e para outros usos. Afirmam que onde a empresa se diz proprietária nunca identificou qualquer vestígio de cercamento ou outra benfeitoria erguida por proprietário algum, que não fosse morador da comunidade que construíram currais, aguadas, cemitérios etc.

A comunidade dialogou com os “proprietários” das fazendas no sentido de esclarecer o uso pela comunidade da área hoje invadida pela empresa, entretanto, a empresa não respeita o direito tradicional da comunidade ao território e exige que os quilombolas apresentem documentos da área.

Acontece que o processo de regularização fundiária de um quilombo obedece a critérios determinados pelo Decreto Federal 4.887 de 2003, que regulamenta os procedimentos de demarcação e regularização fundiária desses territórios, e depende de órgãos estatais como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agraria-INCRA e outros. Portanto, a comunidade não tem obrigatoriedade de apresentar documentos no momento e sim de comprovar sua posse histórica o que, posteriormente será confirmada ou não pelos órgãos competentes. Inclusive já existe processo no INCRA solicitando a abertura de procedimento de regularização do território, conforme protocolo P-54000.125000/2019-69.

Além disso, os quilombolas apelam aos demais órgãos competentes que intervenham e contribuam para que seu território seja demarcado e seus diretos sejam preservados.

HISTÓRICO DA CERTIFICAÇÃO E OUTRAS INFORMAÇÕES SOBRE A GARANTIA DE DIREITOS DOS QUILOMBOS

O Quilombo Curralinho, em Barra-BA foi certificado como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares.

Nome Atribuído: Quilombo Curralinho
Localização: Barra-BA
Processo FCP: Processo n° 01420.103478/2018-40
Certificado FCP: Portaria n° 361/2018, de 19/12/2018

Comunidades Quilombolas: Conforme o art. 2º do Decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003, “consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.”
São, de modo geral, comunidades oriundas daquelas que resistiram à brutalidade do regime escravocrata e se rebelaram frente a quem acreditava serem eles sua propriedade.
As comunidades remanescentes de quilombo se adaptaram a viver em regiões por vezes hostis. Porém, mantendo suas tradições culturais, aprenderam a tirar seu sustento dos recursos naturais disponíveis ao mesmo tempo em que se tornaram diretamente responsáveis por sua preservação, interagindo com outros povos e comunidades tradicionais tanto quanto com a sociedade envolvente. Seus membros são agricultores, seringueiros, pescadores, extrativistas e, dentre outras, desenvolvem atividades de turismo de base comunitária em seus territórios, pelos quais continuam a lutar.
Embora a maioria esmagadora encontre-se na zona rural, também existem quilombos em áreas urbanas e peri-urbanas. Em algumas regiões do país, as comunidades quilombolas, mesmo aquelas já certificadas, são conhecidas e se autodefinem de outras maneiras: como terras de preto, terras de santo, comunidade negra rural ou, ainda, pelo nome da própria comunidade (Gorutubanos, Kalunga, Negros do Riacho, etc.).
De todo modo, temos que comunidade remanescente de quilombo é um conceito político-jurídico que tenta dar conta de uma realidade extremamente complexa e diversa, que implica na valorização de nossa memória e no reconhecimento da dívida histórica e presente que o Estado brasileiro tem com a população negra.

Fonte: FCP