A Justiça Federal declarou suspeição em caráter definitivo de banca examinadora de concurso para professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e anulou sua composição e todos os atos já praticados desde a publicação do edital. A sentença, proferida pelo juiz federal Ávio Mozar José Ferraz de Novaes, da 12º Vara Cível da Seção Judiciária Federal da Bahia, no dia 6 de novembro, também anulou item do mesmo concurso que cerceava direito dos candidatos de interposição de recurso administrativo para questionar avaliações nas fases internas do certame.
A suspeição da banca designada pela UFBA foi comprovada após confirmação da denúncia feita pelo autor da ação de que uma das integrantes da banca possui pública relação de amizade com uma das candidatas aprovadas. Além da amizade, as duas já dividiram inúmeras atividades acadêmicas, o que também ocorreu entre a examinadora e o orientador da candidata em seu Doutorado.
Ao manter na banca uma integrante com flagrante relação com uma das candidatas, a UFBA ignorou determinação expressa do edital, que vedava a presença de membro “sócio de candidato em atividade profissional ou coautor de trabalho científico ou profissional” e “docente que tenha realizado qualquer atividade de pesquisa com o candidato inscrito no concurso”.
O descumprimento da UFBA foi destacado na sentença. Para o magistrado, o princípio da vinculação ao edital “foi violado pela própria ré, que não diligenciou a adequada composição da banca, permitindo que examinadores com comprovada relação com uma das candidatas participassem do certame, maculando o processo seletivo, ocasionando notórios prejuízos à comunidade docente, discente e à própria Universidade Federal da Bahia”.
Instado a se manifestar na ação, o Ministério Público Federal da Bahia (MPF-BA) concordou com as alegações do autor do processo. Para o procurador da República Leandro Bastos Nunes, “a existência de amizade entre a examinadora e a candidata, nos termos do artigo 20 da Lei nº 9.784/99, implica a suspeição da citada componente da banca examinadora e, por conseguinte, macula de nulidade o concurso público ora questionado, que não é suscetível de convalidação”.
A omissão da universidade foi condenada pelo procurador do MPF-BA em sua manifestação. “Verifica-se não ser possível admitir a violação das próprias regras editalícias para permitir que integre a banca examinadora uma professora que tenha relação de amizade com candidata. Esse tipo de desleixo e desapreço pelas normas procedimentais não podem ser aceitos em um concurso público, ainda mais com nível de seriedade exigido para a seleção de candidato apto ao exercício de cargo público de Magistério Federal”.
Autor impedido de questionar nota e critérios de correção
A suspeição da banca não foi o único problema ocorrido no certame. A ação foi ajuizada por um candidato que se sentiu prejudicado após a divulgação do resultado de sua prova teórica de conhecimentos. O concurso não previa possibilidade de interposição de recurso administrativo, tampouco foi disponibilizado espelho de correção e descrição pormenorizada sobre os possíveis erros cometidos pelo autor e as penalizações impostas na atribuição de sua nota.
“É de fundamental importância que, em concursos públicos, os candidatos tenham oportunidade de tomar conhecimento das decisões da banca, podendo questioná-las mediante a interposição de recurso. Trata-se de medida relacionada à transparência que assegura a percepção social de que as escolhas dos organizadores foram lícitas e justas”, pontificou o magistrado na sentença.
O concurso já estava suspenso desde junho de 2023, quando o mesmo juiz havia concedido tutela de urgência ao pedido formulado pelo autor. Com a sentença, não apenas foi declarada a suspeição da banca em caráter definitivo e a anulação de sua composição e de seus atos já praticados, como a nulidade do item 12.1 do edital, obrigando a UFBA a “garantir que os candidatos possam ter ciência das razões de decidir das avaliações da nova banca avaliadora e lhes seja assegurada a possibilidade de recorrer em prazo razoável”.
Ao comentar o caso, o advogado Israel Mattozo, sócio do Escritório de Advocacia Mattozo & Freitas, especializado em concursos públicos e responsável pela ação, lembrou os ensinamentos de um dos maiores juristas brasileiros. “Pontes de Miranda ensinou que a suspeição denota ausência de bom procedimento, o que ficou nítido neste caso. Desde o início do concurso, a banca não se comportou de maneira adequada. Felizmente, o Poder Judiciário não se omitiu e corrigiu o erro”, avaliou.