‘Cuidado para não amanhecer com a boca cheia de formiga’ é uma expressão levada à risca por facções de Salvador em relação a comentários de moradores sobre o tráfico. Na manhã de terça-feira (29), o reciclador Anderson Pereira Conceição, 46 anos, foi encontrado morto em casa após ser espancado na noite anterior no bairro de São Gonçalo do Retiro. A vítima virou alvo de traficantes do Bonde do Maluco (BDM) por comentar a prisão de uma liderança do grupo criminoso no bairro.
Uma fonte policial consultada pela reportagem, que pede para não ter nome e cargos revelados, explica que, para o BDM, Anderson celebrou a prisão do traficante. “Essa comemoração, na verdade, seria um comentário sobre a prisão no sentido de ‘ainda bem que prenderam’. Ele falou isso e, de alguma forma, chegou nos ouvidos de traficantes que são responsáveis por diversos homicídios e espancaram ele”, conta.
O espancamento seria uma ‘lição’ para o reciclador não fazer mais comentários sobre o tráfico porque a vítima chegou a ir para casa depois da ação do BDM, mas acabou não resistindo aos ferimentos que incluem lesões na cabeça. A morte dele foi confirmada pela Polícia Militar da Bahia (PM-BA), que foi acionada através da 23ª Companhia Independente (CIPM) e encontrou Anderson morto.
O Departamento de Polícia Técnica (DPT) fez perícia e o caso foi registrado pela 2ª Delegacia de Homicídios (DH), que vai investigar o caso. A investigação, entretanto, não é a primeira sobre casos do tipo na capital envolvendo o BDM. O policial ouvido pela reportagem lembra que, em março, na Fazenda Grande do Retiro, a facção executou o rodoviário Waldir Barreto Lopes, 54, em circunstâncias similares.
Apesar das primeiras informações apontarem que o caso foi uma retaliação a uma denúncia feita pela vítima, o crime se deu por algo muito menor. “Esse rodoviário, achando que estava em um ambiente seguro, comentou com outras pessoas a morte de traficantes em uma ação da PM dias antes. Esse comentário foi no sentido de dizer ‘menos quatro’, falando que a morte dos criminosos era boa para comunidade. O BDM soube disso e invadiu a casa dele naquela ação brutal”, explica o investigador.
Os ‘menos quatro’ citado pela fonte são os integrantes do BDM que morreram em confronto com policiais no bairro e, mais especificamente, na Fonte do Capim, onde Waldir morava. Segundo a PM, com os criminosos foram apreendidos uma carabina .40, um revólver 38, duas pistolas 380, sete carregadores, 96 munições de diversos calibres, um rádio comunicador, uma blusa camuflada, 15 porções de cocaína, 61 de maconha e uma bolsa.