JUAZEIRO

A ancestralidade como resistência: aldeias guarani cultivam sementes, mudas, cultura e conhecimento

Um grupo de aldeias indígenas Guarani vêm desenvolvendo, no Rio Grande do Sul, um projeto que tem como objetivo principal a conservação, a recuperação e o aumento da biodiversidade em suas aldeias. Implementado em parceria com o Instituto de Estudos Culturais e Ambientais (IECAM), com apoio da Petrobras, o Projeto Ar, Água e Terra – Vida e Cultura Guarani, envolve a construção de viveiros de plantas nativas, intercâmbio de saberes, sementes e mudas entre as aldeias e a recuperação e reconversão de áreas degradadas por meio do plantio de espécies de uso tradicional na alimentação, medicina, arte e rituais.

Coordenado pelo cacique guarani José Cirilo e pela bióloga Denise Wolf, do IECAM, o projeto vem sendo implementado em uma área de mais de três mil hectares de biodiversidade da Mata Atlântica e dos Campos Sulinos (Pampa). Em sua terceira fase, a iniciativa já alcançou resultados como o cultivo e plantio de mais de 80 mil mudas para consumo alimentar do povo indígena, manejo e plantio de mais de 130 diferentes espécies vegetais e 50 hectares de terras degradadas recuperadas, entre outras ações.

A experiência de Denise Wolf com o povo guarani iniciou por volta de 1994 quando ela teve contato com alguns guaranis que viviam na aldeia Cantagalo, na divisa de Viamão com Porto Alegre. Bióloga de formação, ela diz que, a partir desse contato, se apaixonou pela cultura guarani, por sua visão espiritual e pela relação que eles mantinham com a natureza. Ela começou, então, de forma voluntária, a participar de oficinas sobre temas como uso de plantas medicinais e cultivo de plantas alimentícias. Um trabalho que acabou se desdobrando em outros projetos. Começaram a ser dados aí os primeiros passos para a construção do Projeto Ar, Água e Terra, implantado hoje em nove aldeias guarani no Rio Grande do Sul, abrangendo uma área de mais de três mil hectares.

Em 1997, o Instituto de Estudos Culturais e Ambientais, criado na época da conferência ECO92 e que, até então, só tinha realizado trabalhos no Rio de Janeiro, começou a atuar também em Porto Alegre, voltado para o estudo e desenvolvimento de projetos socioambientais, valorizando a recuperação de saberes tradicionais e da biodiversidade. Na época, os guarani manifestaram à equipe do instituto interesse em projetos para a valorização de sua cultura e de sua arte e também para garantir a sua segurança alimentar. Começaram a surgir projetos pequenos, com duas, três aldeias, voltados inicialmente mais para o artesanato, para a arte guarani. O projeto Ar, Água e Terra, relata Denise, começou a ser pensado a partir de relatos dos guarani sobre problemas como a indisponibilidade de matéria-prima dentro do próprio território.

“Eles iam cada vez mais longe para buscar taquara para fazer sua cestaria, já não tinham mais árvores como guajuvira ou cedro, cujos ramos também eram utilizados no artesanato. A partir desses relatos, pensamos a construção de um viveiro, algo que não faz parte da tradição guarani. Começamos a desenvolver, então, um projeto arquitetônico com padrões de construção sustentáveis. Minha irmã, que é arquiteta, desenvolveu voluntariamente junto com eles um projeto que incorporou elementos da cultura guarani, como a direção, os deuses e a orientação não só solar mas também espiritual. Também queriam que não fosse só um viveiro para multiplicar as plantas, mas um espaço onde pudessem realizar oficinas e outras atividades”.

Fonte: Sul21

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