O Senado decidiu nesta quarta-feira (19), por 42 votos a 30, derrubar o veto do presidente Jair Bolsonaro que impediu a concessão de reajustes a servidores públicos.
O tema ainda tem de ser analisado pela Câmara dos Deputados, mas a sessão prevista para as 19h desta quarta foi adiada para a tarde de quinta (20) porque a base aliada do governo foi surpreendida com a derrubada (veja detalhes abaixo).
O impedimento dos reajustes foi uma contrapartida definida pelo governo para aprovar o pacote de socorro de R$ 60 bilhões a estados e municípios, cujos cofres foram abalados pela pandemia.
Ao aprovar o pacote, o Congresso autorizou que governos locais reajustassem salários de funcionários da saúde e da segurança pública que trabalham na “linha de frente” do enfrentamento à Covid-19. Mas o governo vetou, por considerar que a verba enviada não poderia ser desviada para isso.
O trecho também libera a possibilidade de reajustes para algumas categorias de outras áreas, como profissionais de limpeza urbana, de serviços funerários, de assistência social e de educação pública, desde que estejam diretamente envolvidos no combate à pandemia. Essas categorias tinham sido incluídas quando o texto passou pela Câmara, mas foram vetadas por Bolsonaro.
Se o veto for mantido, a concessão de reajustes a qualquer categoria do serviço público fica proibida até o fim do ano que vem. Se for derrubado, essa possibilidade volta a existir para as categorias mencionadas no projeto.
O dispositivo vetado, e que pode ser restaurado agora, também diz que fica proibido o uso dos recursos transferidos pela União na lei de socorro aos estados “para concessão de aumento de remuneração de pessoal”.
Líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO) disse que a derrubada do veto tem um potencial de impacto negativo de cerca de R$ 130 bilhões. Dinheiro que poderia ser poupado com a decisão do governo de barrar o trecho derrubado no Senado.
“É possível […] que nós estejamos, na derrubada desse veto, por exemplo, impossibilitando a população do Brasil inteira de receber a sexta parcela possível do auxílio emergencial. Que seja reconhecido pelos senadores o esforço do presidente Bolsonaro para conceder, além das três primeiras parcelas, duas parcelas extras”, afirmou.
O líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP), disse que vários servidores das categorias morreram no combate à pandemia do novo coronavírus e comemorou a decisão dos senadores.
“Vitória da saúde e da segurança pública. Derrubamos, no Senado, o veto 17 que congelava contagem de tempo de serviço para (anuênios, quinquênios, sexta-parte e licença-prêmio/especial) dos servidores, em especial da saúde e segurança pública que estão na frente do combate à pandemia”, afirmou em uma rede social.
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que solicitou a análise desse trecho de forma separada, também defendeu a derrubada do veto.
“Esse veto trata de impedir os servidores da saúde e da segurança pública que estão na linha de frente da pandemia – já morreram 350 enfermeiros, 217 médicos, outros 300 e tantos policiais – e o estado vai congelar as licenças-prêmios, o tempo para aposentadoria, impedir o direito a anuênios, triênios, quinquênios. Não estamos falando de reajuste de salário. Estamos querendo sejam garantidos [esses direitos] a esses profissionais que estão salvando os brasileiros”, afirmou.
Câmara adia análise
Sem acordo para manter o veto aos reajustes na Câmara, a sessão destinada à análise dos deputados foi adiada e remarcada para esta quinta-feira (20).
Segundo parlamentares ouvidos pela TV Globo e pelo G1, a derrota no Senado foi uma surpresa para o governo, que agora quer tempo para articular a vitória na Câmara.
Embora partidos da base aliada orientem pela manutenção do veto, que pode ter impacto bilionário aos cofres públicos, parlamentares ligados ao Centrão admitem que será difícil manter o veto. O receio dos deputados é “colocar a digital” numa decisão que desagrada servidores da saúde e da segurança.
Outros vetos
O Senado também derrubou nesta terça-feira (19), por 64 votos a 2, vetos do presidente Jair Bolsonaro a duas outras medidas emergenciais válidas durante a pandemia. Os vetos rejeitados também seguem para análise da Câmara dos Deputados.
A decisão restaurou pontos do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e do regime provisório criado para regular relações jurídicas até o fim do estado de calamidade.
Nestes casos, os vetos foram derrubados após acordo entre líderes partidários e o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO). Como a sessão da Câmara foi adiada, as análises só serão concluídas na quinta.
Vetos a outros quatro projetos, que começaram a ser analisados na Câmara e tinham sido derrubados pelos deputados, também foram derrubados pelos senadores – e com isso, caíram de vez. Entre eles, estava o veto de Bolsonaro à obrigatoriedade do uso de máscara em escolas e comércios.
No projeto que criou o Pronampe, programa de desenvolvimento e fortalecimento de pequenos negócios, os senadores restauraram trechos que tratavam do encaminhamento de informações necessárias ao programa pela Secretária Especial da Receita Federal do Brasil ao Banco Central.
Ao vetar o trecho, o governo federal disse que a medida geraria insegurança jurídica por “indeterminação de quais seriam essas informações objeto de compartilhamento, de forma que veicula um conceito amplo, podendo gerar equívocos operacionais no curso da execução do programa”. A recomendação para o veto partiu do Ministério da Economia.
Também foi restaurado o trecho que impedia bancos participantes de negarem crédito por conta de anotação em banco de dado de restrição de crédito.
O veto foi recomendado pelo Ministério da Economia e pelo Banco Central que afirmaram que o trecho “contraria os princípios da seletividade, da liquidez, e da diversificação de riscos ao possibilitar que empresas que se encontrem em situação irregular perante os órgãos do Estado, bem como de insolvência iminente, tome empréstimo, em potencial prejuízo aos cofres públicos”.
Também foi rejeitado veto a trecho do Pronampe que estabelece prazo de carência de oito meses para o início do pagamento do empréstimo pelas empresas.
Para o Ministério da Economia, esse trecho gera risco à própria política pública criada pelo Pronampe “ante a incapacidade dos bancos públicos executarem o programa com as condições apresentadas pelo projeto, as quais poderão ser determinadas por regulamento”.
“A proposta legislativa, ao estabelecer a carência de oito meses, contados da formalização da operação de crédito, com remuneração de capital exclusivamente com base na taxa Selic vigente nesse período contraria interesse público”, afirmou o Ministério da Economia.
Outros vetos de Bolsonaro a essa proposta do Pronampe foram mantidos e, por isso, não precisarão ser analisados pela Câmara. Para cair, o veto precisa de votos contrários da maioria de deputados e senadores.
Na mesma votação em que derrubaram os vetos a trechos do Pronampe, os senadores derrubaram alguns vetos aplicados à lei que criou um regime jurídico especial para as relações de direito privado durante a pandemia.
Foram derrubados vetos a trechos que tratam sobre restrições à realização de reuniões e assembleias presenciais; efeitos prospectivos das consequências da pandemia nos contratos; e proibição de concessão de liminar para desocupação de imóveis urbanos em ações despejo.
Nesse último caso, o governo havia vetado o trecho dizendo que “a propositura legislativa, ao vedar a concessão de liminar nas ações de despejo, contraria o interesse público por suspender um dos instrumentos de coerção ao pagamento das obrigações pactuadas na avença de locação (o despejo), por um prazo substancialmente longo, dando-se, portanto, proteção excessiva ao devedor em detrimento do credor, além de promover o incentivo ao inadimplemento”.
Assim como no texto do Pronampe, outros vetos foram mantidos e, com isso, não serão enviados à Câmara.
Liberação de crédito
Também nesta quarta-feira, Câmara e Senado aprovaram dois projetos de liberação de crédito.
Um deles abre crédito suplementar no valor de R$ 36,7 milhões para as Justiças Federal, do Trabalho e do Distrito Federal.
O outro autoriza o repasse de R$ 166,8 milhões para o Ministério Público da União.